sábado, 16 de fevereiro de 2013

Desmistificação do continente africano



Com a Lei 10.639 vieram inúmeras discussões sobre o ensino da História e Cultura Africana no Brasil.
Os contrários à lei, os que a acusaram de ser arbitrária, alegavam que a História Africana já era ensinada em sala de aula.
Entretanto, é sabido que o conteúdo sobre o continente africano sempre foi tratado de forma rasa pelos livros didáticos, se considerarmos que “desde o final da década de 90 estes recursos didáticos (...) vêm se tornando um objeto fundamental em sala de aula (...)” (ALVES e BARBOSA,2012,p.2), podemos afirmar que antes do surgimento da lei o estudo sobre a África era praticamente inexistente.
É importante entender a necessidade da lei e das modificações por ela realizadas. A educação formal era o único caminho de melhoria para uma população negra excluída da sociedade no pós abolição, entretanto como afirma Santo (apud ALVES e BARBOSA,2012,p.3 ) “percebeu-se que essa educação era excludente e eurocêntrica, então os movimentos negros passaram a reivindicar modificações educacionais que incluíssem a história africana, sua cultura e seu legado para a formação da cultura brasileira”.
Isso ainda, segundo Santos, constou na declaração do final do I Congresso Negro Brasileiro, que foi promovido pelo Teatro Experimental Negro em 1950.
Mesmo com a lei e as mudanças perceptíveis no material didático, ainda se faz necessário uma reconstrução da imagem do continente africano, junto aos professores que foram ensinados dentro de moldes antigos que não tiveram essa temática em seus estudos de graduação e que estão em sala de aula formando novos cidadãos.
Afinal o que sabemos sobre a África
A primeira questão que devemos levantar é nossa própria ignorância sobre o assunto, o conhecimento que temos vem basicamente de duas fontes: livros didáticos e mídia.
Segundo Waldman (2007) uma prioridades é desvendar “ realidades encobertas por mitos, ficções e imagens fantasiosas.”  Não que isso não ocorra com outras regiões do mundo, contudo “a África mais do que qualquer outro continente, terminou encoberta por um véu de preconceitos que ainda hoje marcam a percepção de sua realidade”.
Primeiro durante nossos anos de formação aprendemos somente o que acontecia com os negros ao chegarem como escravos no Brasil, sobre anteriormente, apenas que eles viviam em “tribos” e que estavam sempre em conflito. E muitos desses, criados pelos europeus, como resultado os vencidos se tornavam escravos e depois de trocados por outras mercadorias vinham para o Brasil. Toda essa visão estereotipada da história do continente africano criou o que se chama afro-pessimismo, ou seja, a “África seria incapaz de conduzir o próprio destino (e) deve, portanto, continuar a apelar para o Ocidente na busca de soluções para seus problemas” (WADMAN, 2007, p. 32)
Em Geografia sabíamos pouco, afinal normalmente este era o último tema do livro e acabava extremamente resumido, quando não totalmente esquecido. Mesmo quando ensinado isso acontecia dentro de uma visão eurocêntrica, mostrando como aspectos positivos os recursos minerais e uma fauna exótica. Entretanto, de acordo com a OLIVA (2005) os pontos negativos se sobressaem e  somos inundados com “imagens chocantes de um mundo africano em agonia, da AIDS que se alastra, da fome que esmaga, das etnias que se enfrentam com grande violência.”

Em nossa época, os meios de comunicação são atores importantes, responsáveis pela construção de imagens que eles mesmos tornam públicas. Sendo assim a mídia pode condicionar fortemente as ideias e valores sobre a África que são compartilhados pelos grupos sociais (ou diferentes públicos) que compõe a sociedade brasileira (SOARES, 2009).

Como a grande parte da população só tem acesso aos meios de comunicação em massa e aos livros didáticos, são essas as referências que a grande parte da população tem, contribuindo para um olhar preconceituoso, não só em relação aos africanos, mas também ao afrodescendentes.
Considerando que, independente da profissão, absolutamente todos passam pela escola, e é mais que um dever quebrarmos esse ciclo de informações tendenciosas.
Enquanto professores, de história principalmente, é nosso dever resgatar os fatos e analisá-los dentro de uma compreensão do presente, por si só já se faz importante o estudo de História Africana, assim como outras civilizações que contribuíram para a construção da sociedade contemporânea e se pensarmos na forma racista de como essa história foi escondida e deturpada, nossa obrigação é duplamente mais importante.
Além disso, o afro-pessimismo não é só um problema de como vemos o continente africano, mas também em decisões politicas. Isso serve de apoio a políticas estrangeiras que tentam usar questões sociais para dominar economicamente, sob a alegação de “empregos e melhoria”.
Se pretendemos formar cidadãos críticos e atuantes devemos levá-los a refletir as notícias e politicas existentes atualmente, enfim, se a história é uma forma de entender o presente e mudar o futuro temos que buscar desmistificar o que achamos que sabemos.
Atualmente inúmeros materiais são produzidos para auxiliar os professores a se adaptarem as novas exigências da legislação. Existe também uma constante vigilância sobre os materiais usados em sala de aula e a mídia em geral.
Debates, análises de livros, tudo isso contribui para a melhoria do ensino, mas de nada valerá se não mudarmos nossa forma de pensar.
Buscar outras fontes, questionar o que a mídia impõe e principalmente selecionar cuidadosamente o material didático são forma de reavaliarmos nossos conhecimentos, trabalhando de forma imparcial não só este, mas qualquer assunto.
Assim, fica claro que cabe a nós professores mostrar desde a Educação Infantil a diversidade da cultura africana, sua inegável contribuição para o mundo e principalmente que assim como o Brasil, os países do continente africano estão prosperando e vencendo as adversidades é a única forma de alcançarmos esse objetivo é repensando nosso conhecimento.

Referências
ALVES, Márcia de Albuquerque; BARBOSA, Vilma de Lurdes. A África na Literatura didática de História a partir da Lei 10.639/2003. João Pessoa, Ago. 2012. Disponível em: . Acesso em: 16 nov. 2012.

 OLIVA, Anderson Ribeiro. A História da África nos bancos escolares: Representações e imprecisões na literatura didática. Brasília, 2005. Disponível em: . Acesso em: 16 nov. 2012.

SERRANO, Carlos;WALDMAN, Maurício. Memória D'África: A temática Africana em sala de Aula. São Paulo:Cortez,2007,327 p.

SOARES, Astréia; BARBOSA, Luiz Henrique; CARVALHO, Vanessa de. África como notícia. Salvador, Mai. 2009. Disponível em .Acesso em: 16 nov. 2012.

ZAGO, Álvaro de Barros. A África no livro didático de Geografia. São Paulo, Ago. 2011. Disponível em: . Acesso em: 16 nov. 2012.

Por prof. Dayane Baraldi

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